Sem autorização da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), o ácido bórico em pó está sendo vendido irregularmente em farmácias e usado em receitas caseiras para combater a bromidrose, suor com mau cheiro que ocorre nas axilas e nos pés – conhecida por cê-cê e chulé.
O produto tem ação fungicida e bactericida, mas a Anvisa só permite sua venda na forma líquida (água boricada), na concentração de 3%. O ácido bórico em pó só pode ser comercializado como inseticida e formicida, em embalagens porta-iscas (que não permitem o contato com o produto).
A despeito disso, diversos fóruns de discussão na internet e em sites de relacionamento, como o Orkut, divulgam que banhar-se com o pó de ácido bórico, diluído em água, pode curar a bromidrose. Tanto a Anvisa quanto dermatologistas alertam que a prática pode provocar irritações e feridas na pele.
“Não há estudos nem da eficácia nem da segurança. O uso [do pó de ácido bórico] é empírico, caseiro e, portanto, não é recomendado, porque pode ferir a pele”, afirma a dermatologista Flávia Addor, da diretoria da SBD (Sociedade de Brasileira de Dermatologia).
Desde 2001, o uso do ácido bórico é vetado em produtos para crianças, como cremes, pomadas e talcos. Isso ocorreu porque foram constatadas algumas reações adversas decorrentes do uso, como intoxicações no organismo, hipotermia (diminuição da temperatura do corpo abaixo de 30C) e erupções cutâneas.
Água boricada
Segundo Ana Paula Gomes Meski, dermatologista do Hospital das Clínicas de São Paulo, a água boricada costuma ser um boa aliada no combate à bromidrose porque “seca” os locais úmidos do corpo, que propiciam a proliferação de fungos e bactérias --a razão do mau cheiro. “Na virilha, por exemplo, passar a água boricada com algodão pode funcionar muito bem. Mas não há nenhuma indicação para o uso do pó. Pode ser perigoso.”
Para evitar a bromidrose, a dermatologista aconselha as pessoas a evitarem desodorantes que deixem resíduos na pele, como os roll-on ou em creme. “Com a transpiração, esses resíduos viram meio de cultura [de microorganismos].” Desodorantes com fórmulas manipuladas a pedido do médico também trazem bons resultados, segundo a especialista.
A bromidrose pode ter várias causas. O ambiente quente e úmido dentro dos sapatos, por exemplo, facilita e promove o crescimento bacteriano e fúngico na pele e unhas dos pés. O mau cheiro resulta da multiplicação desses organismos.
“A pessoa deve trocar de meia todo dia e, às vezes, até duas vezes por dia. O sapato também deve ser deixado em um local ventilado”, orienta Meski. Quanto ao mau cheiro das axilas, uma dica da médica é que as pessoas lavem, à mão, blusas, camisas e camisetas. “Só lavar na máquina não resolve. Tem que esfregar com água e sabão. Senão, ao usar a roupa, o cheiro volta novamente.”
Para a dermatologista Flávia Addor, é preciso conhecer a causa da bromidrose para tratá-la corretamente. “Nem sempre o mesmo tratamento se aplica a todos os casos. Há mau cheiro causado por disfunção hormonal e uso de medicamentos, por exemplo.”
Segundo Addor, ainda há muito preconceito envolvendo o tema, o que afasta as pessoas dos consultórios médicos. “O paciente só procura o médico quando o mau cheiro incomoda muito o seu dia-a-dia. Do contrário, tenta resolver com receitas caseiras.”
A estudante M.C.D., 19, de São Paulo, se encaixa nesse perfil. Ela conta que tem bromidrose nas axilas, já consultou três dermatologistas e até hoje não conseguiu uma medicação que resolva o problema. Sua próxima tentativa, relata, será o banho com o pó de ácido bórico, mesmo sabendo, pela Folha, que o produto é proibido pela Anvisa para esses fins e que traz riscos à saúde.
“O odor fétido é terrível. Tranquei a faculdade, tenho vergonha de sair com meus amigos por conta do mau cheiro. Tem sempre um engraçadinho que faz uma piadinha com relação a minha higiene pessoal. Já usei desodorantes manipulados, limão e até botox. Nada funcionou. Vou tentar a dica do ácido bórico que vi no fórum [de discussão, na internet]. Faço qualquer coisa para me livrar desse odor.”
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